
Carta aberta a Carapicuíba
No domingo, 16 de março de 2025, a Oca Escola Cultural foi vítima de violência. Este foi o terceiro episódio apenas neste ano: em janeiro, a Casa das Rendeiras da Aldeia, localizada na Aldeia Jesuítica de Carapicuíba, teve telhas furtadas e sofreu uma tentativa de arrombamento. Em fevereiro, a fachada da Oca foi depredada, com o roubo de fios e lâmpadas. Neste último episódio, em 16 de março, mais uma vez roubaram as lâmpadas e fios da fachada, arrombaram duas janelas e levaram equipamentos essenciais para o nosso trabalho. Com muito esforço e apoio da comunidade, conseguimos recuperar a maior parte dos equipamentos.
Esta carta aberta não é dirigida apenas à comunidade onde a Oca está inserida, mas a todo o município de Carapicuíba. Nosso objetivo é compartilhar que, considerando o que a Oca representa para a comunidade, para o município e para o país, quando somos invadidos, depredados e furtados, essa violência reverbera em toda a comunidade. Afinal, nossa existência e atuação são dedicadas ao seu crescimento e bem-estar.
A Oca Escola Cultural é uma organização da sociedade civil que existe desde 1996. Estamos prestes a completar 29 anos, ocupando a praça da Aldeia de Carapicuíba e seu entorno com atividades que garantem o acesso à cultura, ao lazer e à educação para crianças, adolescentes, jovens e adultos. Com o tempo, nos tornamos um lar para as famílias das crianças que aqui vinham brincar, um espaço de emancipação financeira para mulheres e um ponto de referência para toda a comunidade.
A Oca é um Ponto de Cultura e um Ponto de Memória, o que significa que somos reconhecidos nacional e internacionalmente como referência em Cultura Brasileira e Cultura da Infância, carregando diversos prêmios. Graças ao nosso trabalho, Carapicuíba também é reconhecida como um importante polo cultural no Estado de São Paulo.
A Oca existe porque a comunidade da Aldeia de Carapicuíba existe – e isso é fundamental.
Estamos situados em um patrimônio histórico tombado pelo IPHAN, valorizando histórias e preservando a cultura de inúmeros migrantes e imigrantes que habitam esta região. Também resguardamos a história local, promovendo o reconhecimento dos saberes e da diversidade étnico-racial da comunidade. Quando a Oca é alvo de violência, isso evidencia o descaso com o cumprimento das leis que garantem o acesso à educação, à cultura e à saúde – direitos que a Oca vem assegurando há 29 anos para essa comunidade.
Nossa sede está dentro do Parque da Aldeia de Carapicuíba. Quando não há segurança, não somos apenas nós os afetados, mas todos os moradores da cidade. Além de tantas outras privações, a população perde também o direito de viver em segurança.
Entre as diversas ações da Oca, está o ensino da cidadania para que as crianças e adolescentes da Aldeia saibam que este espaço lhes pertence antes mesmo que a violência aconteça. Eles aprendem que têm direito ao acesso a bens culturais e ao lazer e que cuidar do que é público é fundamental para o bem-estar comum.
Resistimos nesse espaço porque, ano após ano, vemos as mudanças significativas que promovemos na vida de tantas pessoas. Continuamos trabalhando mesmo diante de desafios que colocam nossa sustentabilidade financeira à prova.
A Oca é feita pela comunidade: grande parte de nossa equipe é composta por ex-alunos, mães e familiares de alunos e ex-alunos que tiveram aqui uma oportunidade profissional e hoje podem retribuir oferecendo a outras crianças e adolescentes o mesmo acesso que tiveram. A mudança que promovemos é de dentro para fora, e aqueles que saem da Oca levam impactos positivos para a comunidade e para o município.
Decidimos escrever esta carta aberta não apenas para denunciar os episódios de violência, mas para que Carapicuíba saiba da existência deste espaço que realiza um trabalho essencial para o município, para as crianças e adolescentes, para as famílias, para as escolas públicas parceiras, e que mantém um patrimônio cultural vivo. Se pedimos proteção, segurança e apoio, é porque os maiores beneficiados serão a comunidade e o município.
Somos resistência. Seguiremos lutando pela Cultura Brasileira, pela Cultura da Infância, por uma educação de qualidade, por segurança pública e pelo acesso à saúde.